Refluxo vesicoureteral (RVU): como identificar e tratar

Seu filho já apresentou infecções urinárias repetidas, febre sem causa aparente ou dor ao urinar? Esses sinais, que parecem muitas vezes apenas desconfortos do dia a dia, podem estar ligados ao refluxo vesicoureteral (RVU). Essa condição ocorre quando a urina retorna da bexiga para os ureteres e, em alguns casos, até para os rins, aumentando o risco de infecções e de lesões renais se não for tratada a tempo.

O RVU é mais comum do que se imagina em crianças e merece atenção especial dos pais e cuidadores. Neste artigo, você vai entender o que é o refluxo vesicoureteral, quais são seus sintomas, causas e fatores de risco, como é feito o diagnóstico e os principais tratamentos disponíveis, desde o acompanhamento clínico até as técnicas cirúrgicas mais modernas.

O que é o refluxo vesicoureteral (RVU)?

O refluxo vesicoureteral, conhecido pela sigla RVU, é uma condição em que a urina volta da bexiga para os ureteres e, em alguns casos, até para os rins. Essa “via contrária” acontece por uma falha em uma válvula que deveria impedir esse retorno.

Embora possa parecer estranho, o RVU é relativamente comum em crianças, principalmente nas que apresentam infecções urinárias recorrentes. Estima-se que até 30% das crianças que tiveram pielonefrite (infecção nos rins) apresentam algum grau de refluxo¹.

Além do desconforto imediato causado pela infecção urinária, como ardência e dor para urinar, o risco maior está em possíveis lesões renais ao longo do tempo, caso o problema não seja tratado adequadamente.

Causas e fatores de risco

O refluxo pode ter origem congênita (presente desde o nascimento) ou ser adquirido em decorrência de alterações no funcionamento da bexiga.

Causas congênitas

  • Defeito ou imaturidade no mecanismo de válvula da junção ureterovesical.
  • Malformação do ureter ou da bexiga.

Causas adquiridas

  • Alterações na contração da bexiga (disfunções miccionais).
  • Obstruções que aumentam a pressão da urina dentro da bexiga.

Fatores de risco

  • Histórico familiar de refluxo vesicoureteral.
  • Crianças com infecção urinária de repetição.
  • As meninas são mais acometidas em relação aos meninos, embora o quadro em meninos costuma ser mais grave².

Como identificar os sintomas?

O refluxo não causa sintomas específicos ou seja nem sempre dá sinais claros. Devemos sempre suspeitar da sua presença em toda criança que tem episódios repetidos de infecção urinária, principalmente quando acompanhada por febre.

Principais sinais de alerta:

  • Febre alta sem causa aparente.
  • Dor abdominal ou lombar.
  • Ardência ou dor para urinar.
  • Urina com cheiro forte ou coloração alterada.
  • Infecções urinárias de repetição.

Um exemplo clínico comum é o de uma criança de 4 anos com infecções urinárias frequentes, que após investigação com exames de imagem tem o diagnóstico de RVU confirmado, recebe o tratamento adequado e as infecções urinárias desaparecem.

Como é feito o diagnóstico?

O diagnóstico do refluxo exige avaliação especializada e exames de imagem.

  • Ultrassonografia: pode sugerir refluxo ao identificar dilatação dos rins e ureteres.
  • Uretrocistografia miccional (UCGM): exame padrão-ouro, mostra a presença e o grau do refluxo durante o enchimento e esvaziamento da bexiga³.
  • Cintilografia renal/cistocintilografia: avalia se já houve lesão definitiva nos rins e se ocorre refluxo quando a criança urina.

Hoje, existe um consenso sobre a importância da investigação em crianças com infecção urinária de repetição para evitar cicatrizes renais. De acordo com o conteúdo sobre refluxo urinário infantil, a uretrocistografia é o exame que permite classificar o refluxo em diferentes graus (de I a V), ajudando a orientar a conduta para cada criança.

Segundo a publicação qual exame detecta o refluxo urinário em crianças, exames como o ultrassom com contraste também podem ser úteis, mas o diagnóstico definitivo e o grau do refluxo são confirmados pela uretrocistografia.

Quando o tratamento é necessário

Nem todo caso de RVU exige cirurgia. A conduta varia conforme o grau do refluxo, a idade da criança e a presença de infecções.

  • Grau leve a moderada (I a III): muitas vezes regride sozinho com o crescimento da criança. Nesses casos, recomenda-se acompanhamento e medidas de prevenção.
  • Grau grave (IV e V): mínima chance de resolver espontaneamente. Pode precisar de tratamento cirúrgico, principalmente quando existe cicatriz renal.
  • Infecções de repetição: mesmo em graus menores, podem justificar intervenção.

Tratamentos disponíveis

Acompanhamento clínico

  • Uso de antibióticos em baixa dose para prevenção de infecções (profilaxia).
  • Orientação de hábitos miccionais: evitar prender o xixi, ingerir líquidos, tratar constipação intestinal.
  • Monitoramento com exames periódicos.

Tratamento cirúrgico

Quando a cirurgia é necessária, temos duas principais opções:

  1. Reimplante ureteral
    É considerado o tratamento clássico, com taxas de sucesso acima de 90% segundo estudos recentes, inclusive quando realizado por técnicas minimamente invasivas. Entretanto, evitamos realizar em crianças com menos de 1 ano de vida, devido ao elevado risco de insucesso.
  • Cirurgia aberta ou laparoscópica: reposiciona o ureter dentro da bexiga, criando uma nova válvula que impede o refluxo.                                                           
  • Cirurgia robótica: já disponível em alguns centros, oferece cortes menores, recuperação mais rápida e menos dor no pós-operatório.
  1. Injeção endoscópica de gel biocompatível (Vantris®)
    Também chamada de “tratamento endoscópico”, é um procedimento minimamente invasivo.          

Um material especial é injetado na região onde ocorre o refluxo, formando uma barreira que evita a volta da urina. Pode ser aplicado em crianças de qualquer idade.

É rápido, feito por endoscopia, sem cortes, com alta hospitalar no mesmo dia e excelente recuperação.

No meu site, explico em detalhes como funciona o tratamento endoscópico do refluxo urinário infantil, uma técnica moderna e eficaz¹⁰.

Como é o pós-operatório

A recuperação do tratamento cirúrgico do refluxo vesicoureteral costuma ser tranquila e segura. O tempo de internação e o retorno às atividades variam de acordo com a técnica realizada:

🔹 No reimplante ureteral aberto, geralmente requer 4 a 5 dias de internação. Nos primeiros dias, pode ser necessário o uso de sonda vesical. A criança costuma retomar as atividades leves em 2 semanas.

🔹 No reimplante ureteral laparoscópico ou robótico, como é menos invasiva, costuma permitir alta hospitalar mais precoce (às vezes no dia seguinte) e retorno às atividades em cerca de 7 a 10 dias. A dor pós-operatória também tende a ser menor.

🔹 Nos casos de tratamento endoscópico do refluxo, a criança recebe alta no mesmo dia e pode voltar às atividades escolares em 2 dias. É o método menos invasivo, com recuperação muito rápida, sem necessidade do uso de sonda.

Pais devem ficar atentos a:

  • Sinais de febre ou dor intensa.
  • Alterações no padrão urinário.
  • Acompanhamento regular com uropediatra para checar a função renal e da bexiga.

Perguntas frequentes sobre RVU

  1. O refluxo vesicoureteral sempre precisa de cirurgia?
    Não. Muitos casos se resolvem espontaneamente, especialmente nos graus leves.
  2. O refluxo pode causar insuficiência renal?
    Sim, se não tratado adequadamente e em casos graves, pode levar a cicatrizes renais e comprometer a função².
  3. O refluxo tem prevenção?
    Não há prevenção primária, mas o diagnóstico precoce em crianças com infecção urinária recorrente evita complicações.
  4. Meu filho precisará tomar antibiótico por muito tempo?
    Depende do grau do refluxo e da conduta escolhida. Em alguns casos, a profilaxia antibiótica é fundamental para proteção dos rins até a resolução espontânea ou cirurgia.

Palavra da especialista

Como uropediatra, sei que receber o diagnóstico de refluxo vesicoureteral pode gerar insegurança nos pais. Mas é importante reforçar: há tratamento e as chances de sucesso são muito altas.

Cada criança é única, por isso a avaliação detalhada considerando os exames, a idade e o histórico clínico é fundamental antes de indicar a melhor conduta. Muitas vezes o acompanhamento é suficiente. Quando a cirurgia é necessária, técnicas modernas e pouco invasivas tornam o processo mais seguro e com recuperação mais rápida.

O mais importante é que os pais se sintam amparados e informados. Meu compromisso é caminhar junto com cada família, oferecendo orientação clara e um cuidado individualizado.

Agende sua consulta

Se seu filho apresenta infecções urinárias de repetição ou recebeu o diagnóstico de refluxo vesicoureteral, estou à disposição para avaliar com atenção, carinho e responsabilidade.

Referências

¹: Sociedade Brasileira de Urologia – Refluxo Vesicoureteral. Disponível em: portaldaurologia.org.br

²: Silva JMP et al. Refluxo vesicoureteral em crianças: aspectos clínicos e terapêuticos. Rev Paul Pediatr. 2021;39:e2020075. doi:10.1590/1984-0462/2021/39/2020075.

³: Hospital Israelita Albert Einstein – Refluxo vesicoureteral. Disponível em: einstein.br

⁴: Zanetta VC, et al. Imaging studies for children with urinary tract infection: when are they indicated? J Pediatr (Rio J). 2020;96(3):279-286. doi:10.1016/j.jped.2019.07.009.

⁵: Uropediatria SP – Refluxo vesicoureteral infantil: o que é? Disponível em: uropediatriasp.com.br.

⁶: Uropediatria SP – Qual exame detecta o refluxo vesicoureteral? Disponível em: uropediatriasp.com.br.

⁷: Garcia-Aparicio L, et al. Surgical management of vesicoureteral reflux in children: current trends and outcomes. Eur Urol Focus. 2023;9(2):457-463. doi:10.1016/j.euf.2022.03.006.

⁸: Gundeti MS, et al. Robotic versus open ureteral reimplantation in children: outcomes and complications. J Urol. 2022;208(1):253-260. doi:10.1097/JU.0000000000002451.

⁹: Lima SV, et al. Endoscopic treatment of vesicoureteral reflux in children: long-term results. J Pediatr Urol. 2021;17(4):475.e1-475.e6. doi:10.1016/j.jpurol.2021.05.002

¹⁰: Uropediatria SP – Tratamento endoscópico do RVU: saiba mais. Disponível em: uropediatriasp.com.br.

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Publicado por: Dra. Marilyse Fernandes
Cirurgia Pediátrica (CRM 92676 | RQE 21334) A Dra Marilyse Fernandes é médica especialista em cirurgia pediátrica e robótica, dedicada à urologia infantil com experiência em hidronefrose congênita, malformações genitais e disfunções miccionais. Formada pela Universidade Estadual de Londrina, Doutora em Ciências da Reabilitação pela Universidade de São Paulo (USP) e Pós Graduada em Cirurgia Robótica pelo Hospital Israelita Albert Einstein.

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